Em um relacionamento sério com o sistema operacional
Estreia hoje em todo o
Brasil ELA, novo filme de Spike Jonze, conhecido pela direção de
roteiros inventivos e surpreendentes como os de Quero Ser John
Malkovich, Adaptação, entre outros. O longa é uma
delicada fábula sci-fi, que tem como pano de fundo a relação
do homem com a tecnologia.
Com um elenco que reúne Joaquin Phoenix, Rooney Mara, Amy Adams e Scarlett Johansson,
o filme recém estreou e já faz parte da filmografia essencial para
o nosso espetáculo “No que você está pensando?”
Apaixonar-se
pela voz do seu sistema operacional parece ser falta de qualquer
resquício de sanidade? Não para Spike Jonze que amplia a relação
homem-máquina em um âmbito maior que sua funcionalidade mecânica,
criando uma espécie de ficção científica romântica em seu novo
filme.
Hi, I’m here.
Essa é a primeira frase dita pelo sistema
operacional Samantha (voz por Scarlett Johansson). A simples saudação
anima, pois parece fazer referência ao curta-metragem lançado por
Spike Jonze em 2011 chamado “I'm here”. Nele, Jonze nos faz
imergir em uma história onde a relação homem-máquina transcende a
função instrumental, apresentando-nos a dois robôs que se
apaixonam e nutrem um sentimento tão forte que o ato de doar-se para
o outro é feito sem hesitar.
No
curta, o diretor coloca em questão se os seres lógicos construídos
com chips e peças possuem mais sentimento e amor ao próximo do que
os feitos de carne e osso. Contudo, em Her, o diretor faz
absolutamente o contrário, exibe um relacionamento que parecia ser
improvável e que vai além da relação entre o homem contemporâneo
e a tecnologia.
No longa, Theodore (Joaquin Phoenix) é um escritor solitário de meia idade que escreve cartas de amor para os outros e que preenche o vazio, decorrente de um divórcio, com as mais variadas tecnologias. Vídeo games interativos e sistemas automatizados comandados por voz fazem parte do pano de fundo de uma Los Angeles do futuro (o ano exato não é especificado). Tudo muda quando ele compra um novo sistema operacional para seu computador. Desses hiper inteligentes capazes de realizar tarefas em frações de segundo, como ler um livro.
Embora criados para facilitar a vida humana, o personagem principal utiliza a tecnologia para tornar mais fácil a convivência consigo mesmo. Uma vez que estava carente de perspectivas de vida, apaixonar-se pela voz de seu computador não parecia tão ilógico. Ainda mais quando é uma voz como a de Scarlett Johansson. Entretanto, uma descrição grossa e curta sobre o filme, reduzindo-o em “uma história de um homem que se apaixona por uma versão ultra tecnológica da Siri” é injusta e não compreende as reflexões presentes no contexto.
Esse
conceito bruto pode até ter sido o ponto de partida de Spike Jonze
ao pensar em Her. No entanto, sua mise en scene é construída de tal
forma que um romance entre homem e máquina soa lúcida e porque não
possível? Como uma ode a Annie Hall, eles tentam adivinhar as vidas
de pessoas aleatórias e o piquenique com os amigos de Theodore que
acham Samantha uma ótima companhia são exemplos de cenas em que
acreditamos nessa possibilidade.
O sexo é literalmente transcendental e abre uma questão: precisamos mesmo dos nossos corpos? Ou está tudo em nossos cérebros? Samantha diz que sente Theodore, ao que ele responde entre gemidos que a sente também. É tudo tão real em suas imaginações que todas as necessidades afetivas e sexuais daquele momento são preenchidas, sem o toque, sem o mínimo contato.
É em seu apartamento, refletindo luzes da cidade no chão de madeira onde Joaquin Phoenix impressiona por sua atuação. São momentos de insegurança, de amor desmedido e de loucuras com sua amada virtual que o renderia qualquer grande prêmio de melhor ator. Aliás, o filme ganhou um Globo de Ouro na categoria de melhor roteiro e concorre em cinco outras na premiação da academia (Melhor Filme, Melhor Roteiro Original, Melhor Direção de Arte, Melhor Trilha Sonora e Melhor Canção Original).
No fim das contas, Spike Jonze nos mostra em Her que é um romântico transcendentalista. Como Theodore que está de luto por sua vida, com o atrito de suas limitações em uma espécie de ficção científica romântica que apresenta a perspectiva de uma singularidade que não significa o fim da humanidade, e sim sua libertação. Porque não importa a época, as pessoas sempre vão estar a procura do amor, em qualquer forma.
“Nosso mundo é cada vez mais amável,
especialmente em Los Angeles. No entanto, cada vez um se sente mais
isolado e só. No filme, não se sabe muito bem se esse futuro é
utópico. Mas acho que nossa sociedade tende a isso. E, apesar de
tudo o que precisa, sente-se cada vez mais só” (Spike Jonze)
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